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Por que o mundo vive a maior onda de conflitos em décadas? (Estadão)

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Mudanças climáticas, deslocamentos de poder e a interconectividade global estão entre os principais fatores que podem ajudar a entender a multiplicação de guerras.

O mundo está vivendo a pior onda de conflitos em décadas. Em estudo publicado antes da recente escalada de violência entre Israel e Hamas, o Instituto de Pesquisas de Paz de Oslo (PRIO) indica haver atualmente 55 conflitos envolvendo 38 Estados e calcula a média de duração deles em onze anos. Uma década antes, o mesmo instituto identificou 33 conflitos com duração média de sete anos. Em 2022, mais de 200 mil pessoas morreram em batalhas relacionadas a confrontos envolvendo Estados – mais do que em qualquer ano desde 1984. Esses dados não incluem combates entre grupos não-estatais, como rebeldes ou cartéis de drogas, que matam dezenas de milhares de pessoas por ano – como no México, onde numerosas facções criminosas estão engajadas em conflitos armados.

Vale destacar alguns exemplos. Mais de 600 mil civis morreram durante a recente guerra na Etiópia, em parte devido ao bloqueio do governo, que impediu a entrada de ajuda humanitária no país. Na invasão russa à Ucrânia, morreram centenas de milhares de pessoas desde o ano passado, produzindo a pior crise de refúgio na Europa em anos. Mais de dez mil pessoas morreram nas primeiras quatro semanas do conflito entre Israel e Hamas. Há atualmente uma campanha de limpeza étnica no Sudão, onde a atual guerra civil entre duas facções das Forças Armadas já matou 9 mil e deslocou 5.6 milhões de pessoas. A República Democrática do Congo (DRC) registra 6.9 milhões de deslocados internos em meio à atual guerra civil. Isso sem mencionar as sangrentas guerras civis na Somália, no Iêmen e na Líbia; o conflito entre Armênia e Azerbaijão; a guerra civil no Mianmar; a recente decisão do Paquistão de expulsar 1.7 milhão de refugiados afegãos, que produzirá mais uma catástrofe humanitária; ou a crise generalizada no Sahel, onde o avanço da violência jihadista matou mais de 20 mil pessoas ao longo dos últimos 12 meses.

Não há consenso sobre o porquê do recente aumento de conflitos, mas é possível apontar uma série de fatores relevantes. Na África e no Oriente Médio, a desertificação e a frequência de ocorrências climáticas extremas ameaça populações rurais e acirra a disputa por pastos. Vale lembrar que foi uma seca histórica, entre 2006 e 2010, na Síria que levou jovens daquele país a migrarem para as cidades, elevando o desemprego urbano e aumentando o descontentamento geral. Esse fenômeno contribuiu para as grandes manifestações contra o governo cuja repressão brutal causou uma guerra civil, que já matou mais de 300 mil pessoas.Outro fator é o efeito desestabilizador de conflitos já existentes em um sistema econômico e político muito mais interconectado e vulnerável do que antes. Por exemplo, em função da invasão russa à Ucrânia no ano passado, o preço do trigo e de fertilizantes explodiu, elevando a inflação e a miséria em numeroso países…

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SOBRE

Oliver Stuenkel

Oliver Della Costa Stuenkel é analista político, autor, palestrante e professor na Escola de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV) em São Paulo. Ele também é pesquisador no Carnegie Endowment em Washington DC e no Instituto de Política Pública Global (GPPi) ​​em Berlim, e colunista do Estadão e da revista Americas Quarterly. Sua pesquisa concentra-se na geopolítica, nas potências emergentes, na política latino-americana e no papel do Brasil no mundo. Ele é o autor de vários livros sobre política internacional, como The BRICS and the Future of Global Order (Lexington) e Post-Western World: How emerging powers are remaking world order (Polity). Ele atualmente escreve um livro sobre a competição tecnológica entre a China e os Estados Unidos.

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